DESIGUALDADE SOCIAL NO BRASIL: É POSSÍVEL, É NECESSÁRIO, É CONVENIENTE COMBATÊ-LA?

31-01-2012 20:28

sábado, 8 de agosto de 2009

 

"SÓ QUEM TEM VACA É QUE GANHA BEZERRO"

    INTRODUÇÃO

    Muito se fala em desigualdade social no Brasil e no mundo. Especialmente numa estrutura sócio-econômica como a nossa, onde a grande maioria da população encontra-se abaixo do nível mínimo da miséria total, ou seja, na carência, muitas vezes, quase que absoluta. Enquanto isso, uma casta hegemônica, especial e privilegiada em todos os aspectos desfruta, não só de muitos benefícios materiais e intelectuais, como também dos meios de produzir e o que é mais sério, do poder de decidir principalmente, sobre as diretrizes que continuam a nortear o modelo de sociedade que beneficia os já quem já tem todos os privilégios, e, logicamente prejudica cada vez mais os menos favorecidos num eterno ciclo vicioso de dor, sofrimento, necessidades e crises.
    Precisamos entender, segundo Demo(2 003), que a materialidade da pobreza não pode jamais ser relegada – carência de renda, emprego, moradia, remédios, comida - , mas menos ainda pode-se deixar de lado a manobra política implicada e que se constitui no cerne da fabricação da miséria. A carência engloba a manifestação externa da pobreza, que é, ao mesmo tempo, meio mais imediato de manipulação política. Servindo, especialmente como canal-filtro mais    que eficiente para, digamos, ocultar os revezes do fenômeno da desigualdade social.
    Pois, como os meios de sobrevivência não têm possibilidade de criação espontânea, capaz de satisfazer todas as necessidades e ganâncias; a extrema riqueza para poucos só pode ser concretizada com a fabricação da miséria para muitos. É um sintoma por demais lógico, dispensa maiores explicações teóricas ou mesmo práticas, é física pura que não pode ser, por exemplo, com fundida com a onipotência de um Deus que assim o quer. Devemos relativizar o fenômeno em si e entende-lo a partir da lógica simples com a qual ele nos apresenta. Mas como preferimos politicamente sermos cínicos e céticos, nós apenas optamos por não enxerga-lo e não entende-lo enquanto ele nos destrói a todos.
    A cultura popular do interior goiano, onde eu nasci e me criei; inventou e repete dia-a-dia um refrão inicialmente folclórico, e, ao mesmo tempo, uma grande verdade. Segundo a qual “só quem tem vaca é que ganha bezerro”. Ou seja, o encaminhamento de um sistema que legaliza desigualdades, também as amplia, dando ao fenômeno um caráter absolutamente normal, legal e justo como se alguns fossem mais iguais do que os iguais, e, por isso mesmo, dignos e justos detentores de tudo, concentrando em suas mãos o poder e a renda, resultando, é óbvio na falta de tudo para os que não participam desta roda frenética dos socialmente privilegiados.
    Assim, muitas as estruturas e conjunturas convergem para este ponto em todas as dimensões da sociedade, dentre as quais, para fins didáticos, podemos exemplificar: alguns pontos importantes. Na nossa estrutura administrativa quem ganha mais, trabalha menos. O trabalho de maior status é pago com melhores salários; realizado sob condições mais especiais, gerindo privilégios maiores para uns e prejudicando imensamente outros. O que considero mais grave é que, na empresa, assim como na vida, este processo se dá de uma maneira absolutamente antagônica. Ou seja, quem trabalha mais é justamente quem ganha menos. Quem ganha mais tem mais privilégios, mais benefícios; mais férias, menos controle. Enfim, quanto mais as diferenças avançam, melhor. Pois assim pode-se dar vazão e incremento ao processo efetivamente competitivo, perpetuando a diferença social em todos os seus demais aspectos. E que se afunila qualitativa e quantitativamente em termos de distribuição de renda; de religião; de condição social e sexual; intelectualidade e assim por diante.
    No campo da administração, Tavares(2 000); nos retrata, de forma muito inteligente o tema desta mesma desigualdade, quando fala dos modelos organizacionais holísticos – como um dos instrumentos para busca de solução do problema, sobre sistemas de gestão em rede, que, além de aumentarem a eficiência dos processos de produção, visam igualmente a valorizar seus agentes. Descentralizar o poder de decidir e planificar o “status quo” das pessoas, gerindo por si, mais prazer, qualidade de vida e acesso aos meios que possam garantir um mínimo de dignidade para todas as pessoas. Equalizando a importância de tudo o que fazem em função da produção final da organicidade, que, em última análise, deve ser retornada em benefício real de todos os que constituem a sociedade global em que esta organização se firma e para a qual presta seus serviços. Utópico demais, poderiam dizer alguns. Mas utopia é aquilo que a gente não faz acontecer, eu, por exemplo, responderia de pronto. Mas, por outro lado, perante a dureza dos raciocínios e os atrasos conceituais que ainda vivemos, ainda estamos historicamente há milênios para encontrarmos este tipo de realidade.
    Se analisarmos a questão - desta mesma desigualdade - em outros campos da ação social, veremos que ele se repete monotonamente em todas as demais dimensões: na política, na economia, na educação, nas famílias, enfim, em todos os ditos meios sociais. Apenas utilizando-se de estratégias e meios, discursos novos e medidas camufladas que falam em mudança no exato sentido de evita-la e para filtrar esta aparência, criando assim uma falsa estratégia de harmonia e moralidade. É na educação, notadamente no ensino superior, onde hoje, por exemplo, fala-se na maquiagem das quotas para os negros e outros litígios legalmente aceitos, que acabam por manter o mesmo sistema caótico no âmago da realidade social macro. O que, é claro, resolve aparentemente o aspecto quantitativo e imediato do problema, embora crie facções psicológicas, sociais e políticas até mais sérias. Coisas do tipo “negro é mental e intelectualmente incapaz e só entra na universidade se for pela janela”. Isto sem contar que o negro irá para uma universidade absolutamente racista, onde terá acesso a uma “ciência branca”; possivelmente para aprender a se subordinar mais facilmente ao paradigma de predomínio exclusivo para o branco, o macho e o capital; legalizando cientificamente a sua ainda maior dependência aos sistemas impostos.
    As quotas para os negros entrarem na Universidade não seria mais uma estratégia camuflada, para, em longo prazo, acessar ainda mais o sistema orgânico e cultural das desigualdades sociais? E, igualmente por que criar quotas para os negros, se a maioria pobre de outras raças também não tem acesso à boa universidade pública, gratuita e supostamente de “boa qualidade” (restando saber para que e para quem esta qualidade realmente funciona e dá resultados) ? É justo criar mais um fator de desigualdade entre negros e pobres de outras raças? Isto não seria mascarar um sentimentalismo piegas que acaba por desvalorizar ainda mais a figura do negro? Não estaria aí oculta uma outra forma de racismo ainda mais refinada e com uma essência assistencialista fria e ao mesmo tempo extremamente maquiavélica? Depois de brancos e negros formados pelas Universidades, quem ocupará logicamente as melhores vagas possivelmente ofertadas no mercado de trabalho? Não seria esta mais uma questão para se refletir com muita profundidade sobre o fenômeno das desigualdades sociais neste País?
    Aliás, aí, na questão dos privilégios absolutos do branco, do macho e do capital, já se estabelece o início da tríade das desigualdades sociais; pois são estes os fatores determinantes dos processos de poder e de suas especiais benesses e privilégios em todos os campos da ação humana.
    É como caminham as civilizações contemporâneas. A estrutura do conhecimento continua nestas bases que são seguidas de perto pelos programas de recrutamento e seleção de pessoas para ocuparem; os postos de destaque no mercado de trabalho, nos meios sociais, na cultura, nas artes, na educação, enfim, em todos os segmentos.
Faz-se necessária uma verdadeira “revolução copernicana” em todos os meios onde os valores especulativos e muito antigos que direcionam benefícios e poderes para poucos, condenando milhões e milhões de pessoas à degradação e à barbárie. Devemos redefinir papéis e importâncias, dando a todos a relativização das suas funções dentro dos princípios fundamentais ditados pela milenar sabedoria chinesa que diz que: “nada é mais fundamental do que qualquer coisa. E na natureza, não existe nada nem mais e nem menos importante; os galhos que brotam são, harmoniosamente; uns longos, uns curtos”(Capra, 2001).
    Particularmente acredito na necessidade de se definir políticas sociais verdadeiramente impactantes e capazes de reduzir estas desigualdades; pelo menos no sentido de garantir a todos um nível mínimo de vivência nos vários segmentos e exigências da sociedade atual. É fundamental que todos comam, morem, cuidem de sua higiene, lazer, prazer, saúde, transporte, educação, segurança, e, fundamentalmente, do seu pleno bem-estar e alegria de viver e de continuar a viver. Penso que é chegada a hora de transcendermos o paradigma dos rigores científicos, mas agregando às ciências valores e princípios que vão da solidariedade humana à ética profunda; que possa se preocupar em garantir a todos não só padrões de vida; mas igualmente instrumentos e meios de felicidade, no mínimo aquela considerada como socialmente aceitável.

       PROPORCIONALIDADE: UMA TERCEIRA VIA

    Estamos falando de desigualdades sociais como algo concretamente instalado e comprovado nos fenômenos que assolam a realidade cotidiana que hoje pode muito facilmente ser acompanhada e conhecida em todos os rincões do Planeta. A desigualdade está aí, escabrosa, fazendo acontecer suas intempéries e muitas vezes, levando a vida a padrões quase que insustentáveis. Se é possível a desigualdade, seria possível existir a igualdade? E aqui, quando falo em igualdade; isto não se torna ainda algo muito mais longínquo e praticamente sem condições ou esperanças de acontecer? Minha explicação é que a desigualdade pode ser caracterizada em muitos espaços, padrões e discernimentos maiores, menores, mais próximos ou distantes. Por isso desigualdade existe. Mas igualdade, não. Podemos, isto sim, falar, quando muito, em proporcionalidade; homeostase; equilíbrio dinâmico na distribuição de meios e condições para que todos vivam e o façam com a dignidade possível.
    Em um velho; amarelado e substancioso volume de As maravilhas da matemática, de Malba Tahan; no qual não pude encontrar data, local ou editora; constatei a existência de um curioso enunciado de muitas páginas, que o autor identifica como “Lei da Média-Extrema Razão” ou “Lei da Proporcionalidade Áurea” – (proporcionalidade de ouro). E faz, no meu entendimento; uma explicação muito sábia; em que transfere para dados numéricos a proporção da totalidade (100% - cem por cento); para as dimensões numéricas de 38%(trinta e oito por cento) sobre o contexto e 62%(sessenta e dois por cento) sobre o eixo. O que aqui tento explicar como uma saída política para enxergarmos e atacarmos de frente a questão das desigualdades sociais e seus dramas contra a qualidade de vida humana em sociedade; frente à distribuição dos meios de sobrevivência e de todos os valores e circunstâncias vivenciais daí decorrentes.
    Mais tarde, descobri que o cientista social brasileiro W. de Gregori (casualmente residindo agora em Brasília); utiliza destes mesmos conceitos em seu precioso livro: Capital intelectual e administração sistêmica(2 000), de onde retiro a seguinte citação:
    Segundo De Gregori, se, por exemplo, uma organização tem um lucro líquido, digamos de R$ 100,00 (cem reais) no final do mês, então, pela lógica natural das coisas; os R$62,00(sessenta e dois reais) deverão ser destinados para a remuneração do capital. Inclusive constituindo o lucro capitalista da empresa; e, logicamente; os R$38,00 (trinta e oito reais) restantes, seriam legitimamente destinados à remuneração do trabalhador que foi quem realizou o efetivo produto. Assim, teríamos o equilíbrio dinâmico sem ganhos ou perdas exageradas para quaisquer dos lados; garantindo assim uma sobrevivência digna para ambos.
    Mas, segundo as explicações dos citados autores, o que acontece por razões eminentemente competitivas é que ao invés dos meios de produção e da riqueza serem distribuídos na proporção de 38% X 62%(trinta e oito por sessenta e dois por cento); eles são criminosamente separados em grupos de 10% X 90%(dez por noventa por cento). Ou sejam, os 10%(dez por cento) que detêm o capital; ficam com os 90%(noventa por cento) dos bens; da renda; dos recursos. Por fim, são muitos recursos e meios para pouca gente; sendo que o contrário se reflete antagonicamente da mesma forma; ou sejam pouquíssimos recursos e meios para muitas pessoas. Daí o fator da desigualdade. Enquanto uns poucos detêm tudo, todos os demais se debatem em busca das migalhas que sobram; o que pode ser analisado e planificado em todas as realidades sociais, das mais simples às mais complexas.
    O autor apresenta, como ponto explicativo a “Teoria das Pirâmides Invertidas”, onde na representação dos grupos sociais, a ponta da pirâmide representa os dez por cento, que fica, automaticamente com o acesso aos noventa por cento que figuram na pirâmide invertida colocada imediatamente em sua frente. Sendo que a situação inversa é também correlata, ou seja, os noventa por cento das pessoas ficam com os míseros dez por cento restantes da riqueza produzida. Ao contrário da situação anteriormente descrita; são muito poucos recursos que se destinam a muita gente. Daí, é claro, a carência, a miséria, a dependência, o sofrimento material e a fome; o que, em última análise, sintetizam a própria desigualdade social que aqui discutimos.
    Na família, nas relações do dia-a-dia, esta dimensão se repete. Embora, estrategicamente filtrada nos mecanismos de afeto, carinho e confiança que de verdade, ou simbolicamente, como um instrumento para negligenciar ou ocultar a competição que acontece em casa. Este conflito permanece escondido; indo depois explodir no campo social quando este agente da família tiver, mais tarde, meios ou instrumentos para extravasar sua mágoa acumulada. Seja no exercício da sua função profissional, como pai, como mãe ou em qualquer outra situação de poder que a vida lhe proporcionar (Costa Neto, 2 001).
    Esta visão de proporcionalidade que pode, ao meu ver, ser considerada como uma nova proposta de análise para buscar soluções para o problema da desigualdade, que não limita ao plano econômico; mas, é claro; começa aí nas sociedades capitalistas, se encontra completamente fundamentada na obra de Müller (1 958). No seu trabalho em muitos volumes, em que a partir da denominação de “Instrumentos Basilares da Teoria da Organização Humana – T.O.H.” implementado por meio de pesquisas sociais feitas pela Escola de Sociologia Política da Universidade de São Paulo – USP; de cujos elementos surgiram vários movimentos de base comunitária e de redimensionamento da concepção política e da cidadania; inclusive, alguns deles; liderados e mantidos pela ala progressista da CNBB – Confederação Nacional dos Bispos do Brasil, dentre os quais destacamos a Teologia da Libertação (que se é teologia, como pode ser da libertação?); liderada pelo arcebispo católico brasileiro, Leonardo Boff.
    Acredito que uma criteriosa análise desta questão da proporcionalidade mereceria especiais cuidados, sendo um fator da mais extrema importância a ser utilizado em todas as práticas sociais, visando solucionar o eterno problema das grandes desigualdades, principalmente materiais e econômicas que significam o vetor da qualidade de vida das pessoas, numa sociedade marcada pelo vínculo quase que exclusivo do ter. O que a moderna antropologia nos explica como similaridade dos fenômenos, conforme Laplatine(2 000), e que se desdobra em todos os aspectos.
    Portanto se o exemplo acima se aplica na distribuição real ou simbólica dos lucros de uma organização - ou na disputa de crianças para ver quem fica com a última bala do pacote -; certamente podemos ampliar este raciocínio para os grandes domínios do poder; as definições políticas; as redes internacionais, a economia mundial; a degradação da natureza e dos recursos naturais em todo o mundo. Inclusive, uma das minhas intenções no Doutorado em Sociologia é o aprofundamento do estudo desta tese; para o que tenho pensado profundamente em convidá-lo; Professor Pedro Demo para orientar-me e, de antemão; já gostaria de saber o que o senhor pensa a respeito, no que fico no ansioso aguardo da sua resposta.

      REFLEXÕES TEÓRICAS COMPLEMENTARES

    Analisando ainda a desigualdade social como um fenômeno histórico e cultural, conforme retrata Demo (2 004), quando nos fala da sua essência no cotidiano das sociedades, enquanto acompanha a dinâmica evolutiva da história do homem no mundo. Como um fenômeno estruturado, parece que a desigualdade caminha num sentido contraditório, e ao mesmo tempo, paralelo à própria evolução dos meios tecnológicos. Sendo que, quanto maior a evolução técnico-eletrônica; proporcionalmente maior se torna o fenômeno da desigualdade em todo o mundo “civilizado”. E isto não acontece apenas do ponto de vista quantitativo, mas também, qualitativo.
    Em progressões que tento explicar como sendo: temos hoje muito menos ricos e muito mais pobres. Com a agravante humana, política e social que os “poucos” ricos são escandalosamente muito mais ricos. Enquanto os muitos milhões de pobres (ou seja, uma quantidade muito maior) são assustadoramente mais pobres; alcançando níveis da mais absoluta e insustentável miséria; para um percentual muito grande de homens, mulheres e crianças em todas as partes do mundo.
    Na base do problema da desigualdade está o da dominação. Entende-se por ela o fenômeno de comando que um grupo (geralmente minoritário) exerce sobre o outro (geralmente majoritário). É um fenômeno necessariamente social porque supõe relacionamento e condicionamento de dois lados, mas é, sobretudo, social, porque supõe desigualdade (Demo, 1 985).
    Há pensadores que defendem a idéia da possibilidade de uma variante histórica frente à sua evolução; que o têm demonstrado em nível das constatações dos fenômenos sociais geradores da pobreza da humanidade; principalmente nos últimos tempos.
    Só para exemplificar, pois foge ao objeto do presente ensaio, análises mais profundas de intermináveis fenômenos causadores da desigualdade social, podemos citar a notória presença da educação formal das pessoas por meio dos instrumentos estatais e particulares de educação. Estes, por sua vez; como correntes de ação igualmente determinadas pelos órgãos do governo; cujo objetivo é, de fato, perpetuar a ignorância material das massas para tê-las sob o jugo da dominação e da exploração do homem pelo homem; por meio de técnicas e instrumentos cada vez mais sofisticados de se conduzir tais processos pela via da história da humanidade(Costa Neto, 2 003).
    A pós-modernidade retrata que tudo muda, mesmo que lentamente. O que, no caso da desigualdade social denota um princípio de lentidão e pastosidade históricas; até porque o ciclo de vida do ser humano é demasiadamente curto; não presenciando assim transformações consideráveis, o que dá a impressão de ser um fenômeno estático ao longo do tempo. Sempre se ouve falar em desigualdade social e, ao que parece ela apenas engrossa suas fileiras; aumentando sua dimensão e se perpetuando em todo o mundo contemporâneo.
    Assim, historicamente o caos se estrutura e o “vir a ser” da sociedade não obedece a um contorno linear. E desta feita, a desigualdade não é sempre a mesma, mas ocorre em ciclos sempre com maiores e diferenciadas dimensões.
    Se analisarmos em sua sutileza, podemos citar o declínio acentuado da classe média brasileira nos últimos vinte anos; o que aparentemente não parece significar muito, mas na verdade representa um declínio econômico na ordem de muitos milhões de dólares, o que é acompanhado de perto pela queda sócio-cultural e da qualidade de vida como um todo. E no meu entender, são estas as minúcias das quais decorrem o fenômeno sócio-político; nosso efetivo objeto de estudo.
    A cada recomeço da história, a dinâmica muda; a própria conjuntura da existência viva tem como base a mudança.         Quantitativa ou qualitativa, ou ainda em ambos os aspectos ela tem que, necessariamente acontecer. As estruturas que permanecem são as que mudam. O ser humano muda. Quantas mudanças históricas acompanhamos que são vividas pela igreja, por exemplo, que continua aí firme como uma das mais sólidas e antigas instituições? Por isso a desigualdade persiste. Ela é dinâmica, ataca diferentemente classes sociais distintas em cada um dos ciclos da história; tendo como causas básicas pobrezas e misérias que igualmente se articulam em pólos por vezes até antagônicos que eu chamaria didaticamente de “pobreza da pobreza” – pois o pobre é pobre politicamente, culturalmente; é pobre de concepção, de crença, de vontade. É uma vítima incauta de sistemas de valores, comunicação e crenças que fazem com que eternize a sua pobreza e ainda, reze e agradeça por ela.
    Por outro lado, temos a “pobreza da opulência” – que leva o rico a ser política e culturalmente pobre – e até mais pobre - arrogante, competitivo, egoísta e centralizador; sem condições de perceber que este estilo cético e frio de levar a vida só acelera as diferenças sociais que, historicamente acabará por também atingi-lo.
    Atuar em processos de reduzir desigualdades sociais é encarar, de imediato, esta dupla dificuldade; este obstáculo que se torna absolutamente intransponível: “a pobreza da pobreza” e, ao mesmo tempo, a “miséria da riqueza”, que são pontos absolutamente antagônicos e capazes de emperrar quaisquer tentativas de operacionalizações de mudanças concretas neste campo de ação. Daí a perpetuação do fenômeno que já é caracterizado como histórico e estrutural; porque resiste e se amplia enquanto persistir a vida humana em sociedade. Como continuamos presenciando por gerações a fio. O fenômeno da desigualdade sempre se apresenta com novas e maiores dimensões; atingindo cada vez a mais pessoas e ampliando o seu grau de gravidade, tanto do ponto de vista quantitativo quanto qualitativo.

     CONCLUSÃO

    A indução de fatos repetitivos leva à generalização, Popper (1 974); que é impraticável e ilógica. Nada é genericamente a mesma coisa ao longo do processo dinâmico da história; nela não há linhas retas. A complexidade social exige outras medidas e a contextualização e o redirecionamento dos estudos teóricos clássicos para que possam dar respostas válidas aos problemas reais e contemporâneos, tal como eles se dão na realidade concreta que aí está.
    Claro que além de generalista é, também, absolutamente simplista afirmar que as sociedades serão sempre desiguais. Primeiro porque sempre é muito tempo, e, segundo, porque os ciclos evolutivos da história não obedecem a nenhuma objetividade, pelo menos, aquela cientificamente mensurável ou previsível. Mas, pelo mesmo entendimento dos processos históricos que vêm se repetindo ao longo dos milênios; é mais que coerente e pertinente se preparar para que as sociedades sejam desiguais. É uma questão da lógica probabilística, com a inserção de valores quânticos; que gozam hoje da mais profunda respeitabilidade científica em muitas arenas do pensamento científico contemporâneo.
    A desigualdade social tem sido uma verdadeira tendência, pelo menos, até o presente momento histórico vivido pela humanidade. Até porque a sociedade humana quer, a despeito de toda a evolução e disponibilidade de recursos e meios, continuar sendo profundamente desigual. Pois só a desigualdade garante a supremacia de uns sobre outros. E ainda, somente ela é que garante que uns cozinhem para que outros comam. Que uns sujem para outros limparem, e, enquanto alguns dormem confortavelmente outros suam nos campos; se sangram e morrem na guerra. Como muito bem nos fala Churchman (1 972), quando defende a adoção de um novo paradigma sistêmico, para só assim começarmos a pensar em instrumentos que pudessem contribuir na busca de solução para os grandes problemas do mundo, dentre os quais, certamente, deveríamos listar a grave desigualdade social entre os povos do Planeta.
    A concepção dual da sociedade dá a um lado o poder de decidir, os recursos e os meios de ação; a respeitabilidade para agir; os instrumentos para vencer, e, depois, se assusta com o caos, o sofrimento, a fome, a miséria, a opressão; a violência. É um fenômeno, no mínimo estranho que se confunde com a falta de visão e de responsabilidade social, numa concepção de vida absolutamente egoísta e centrada em si mesmo. Falta solidariedade; os princípios éticos, e, acima de tudo; a coerência para com a luta e a vivência social no sentido de atender aos interesses das massas oprimidas e famintas.
    É mais que tempo de abandonarmos determinados rigores evidentemente burgueses e ultrapassados para que a ciência possa, de fato, exercer a sua função mínima: a de servir igualmente a todos os seres humanos, buscando compatibilizar os meios de uma sociedade democrática, igualitária e livre, e por que não? – uma sociedade feliz.
    Não podemos mais repetir os erros do passado. Ou vamos continuar sendo uma sociedade realmente “escravocrata” e sem vontade política para resolver este problema? Basta de só falar em democracia e consciência política do povo; mas devemos fazer a palavra andar no sentido da concretização do seu ideal maiorl; colocando um fim definitivo na era da sociedade excludente, em que a grande massa da população continua àmargem de tudo o que possa beneficiar as pessoas. É preciso que comecemos a relativizar as questões do caos social, do crescimento, da qualidade de vida; da transformação da conjuntura da vida humana; onde todos passem a ter direitos e meios de viver com dignidade, decência, água potável, espaço, lazer, saúde, educação, ar respirável... “comida, diversão e arte...”.
    E, para finalizar, como sou amigo íntimo da poesia, gostaria de citar uma página musical do nosso Milton Nascimento. “Caxangá”; uma canção popular brasileira que considero um dos mais belos e vibrantes protestos político-sociais de nossa arte musical, em que, em sua letra pergunta: - “Veja bem meu patrão, como pode ser bom? – Você trabalharia no sol e eu tomando banho de mar!...”
 

(*) Administrador, especialista em gestão de pessoas e sociologia do desenvolvimento. Mestre em educação e concluinte do doutorado em Sociologia da educação e contemporaneidade, pela Universidade de Brasília-UnB.É professor universitário, pesquisador, conferencista, consultor de empresas e escolas, autor de inúmeras obras fundamentadas na CSP, dentre as quais a Metododologia do Planejamento Sistêmico-Contingencial; Pesquisa para Holodiagnóstico em Gestão de Pessoas; Projeto Pedagogia da Complexidade, além dos livros: Educação alienante existe; Paradigmas em educação no novo milênio e Escolas & Hospícios - ensaio sobre a educação e a construção da loucura.

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